Política

 Prefeita Fernanda Marques: Prescrição quadrienal

Fernanda Marques foi condenada pela Justiça Federal do Piauí por crime previsto na Lei das Telecomunicações

O advogado piauiense Miguel Dias Pinheiro publica nesta quinta-feira aqui no Portal Az um parecer jurídico opinativo e de interesse coletivo, de ordem pública, sobre a possível perda do mandato de prefeita de Luzilândia de Fernanda Marques, irmã da deputada estadual Janainna Marques.

O advogado entende que o direito de punir do Estado prescreveu e, por consequência, o direito para executar a pena, não devendo, pois, ensejar a perda do mandato eletivo.

Fernanda Marques foi condenada pela Justiça Federal do Piauí por crime previsto na Lei das Telecomunicações. Por ter criado e colocado no ar uma rádio comunitária clandestina no Muncípio de Joca Marques. A condenação foi de 02 (dois) anos, pena mínima prevista no art. 183, da referida legislação federal, apontado pelo juiz como crime contra a Administração Pública. Veja o parecer:

Parecer

EMENTA: Para calcular a prescrição punitiva basta invocar-se a aplicação do art. 109, V, do CP. A regra geral é que a base de cálculo se dá a partir do máximo da pena tipificada, concretamente. Operando-se – como se operou – a prescrição punitiva pelo decurso do tempo, o Estado perde o poder de executar a sanção imposta.

 

Por se tratar de questão de ordem pública, de interesse coletivo, o Caso Fernanda Marques, atual prefeita de Luzilândia, que teve, recentemente, seus direitos políticos suspensos decorrente de condenação por crime comum (não político, claro!), merece uma análise jurídica no tempo e espaço.

SEM DÚVIDA ALGUMA, O CRIME PRESCREVEU!

Observe-se, pois, que a denúncia contra Fernanda Marques por crime de telecomunicações fora ofertada em 20 de abril de 2016, sendo, “a posteriori”, recebida a peça acusatória pelo juiz titular da 3ª Vara Federal/PI.

Sabe-se, portanto, que a prescrição da pretensão punitiva ocorre após o trânsito em julgado da sentença condenatória. Para impedir, claro, a execução da pena e, consequentemente, extinguir a punibilidade.

É o caso específico aqui reportado. Porque da data do recebimento da denúncia até o trânsito em julgado da sentença condenatória transcorreram-se mais de 7 (sete) anos.

Dita o Código Penal, “verbis”:

Art. 107 – Extingue-se a punibilidade:  (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
(…)
IV – pela prescrição, decadência ou perempção;

Em arremate:

Art. 109.  A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1°, do art. 110, deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (Redação dada pela Lei nº 12.234, de 2010).
(…)
V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;
Estamos, portanto, diante de uma pena definitiva em concreto, aplicável no seu mínimo legal (2 anos).

Observe, agora, a dicção do inciso V, do art. 109, do CP, que trás a prescrição “…em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois”.

É o caso. Porque a pena máxima cominada a Fernanda Marques foi, em concreto, de 2 anos.
Consequentemente, da data do recebimento da denúncia até o trânsito em julgado da sentença condenatória transcorreram-se um pouco mais de 7 (sete) anos, tempo mais que suficiente para reconhecer a prescrição como causa de extinção da punibilidade.

Agora, cabe aqui fazer-se uma distinção entre o “Jus Puniendi” e o “Jus Executionis”. O segundo, é o poder-dever de executar a sanção penal, a chamada pretensão executória que acontece após o Estado definir a aplicação da pena ao autor do crime.

Entretanto, para exercer o “jus puniendi” o Estado precisa buscar uma sentença penal condenatória definitiva. Como ocorreu no caso concreto. Ou seja, quando a sentença condenatória transita em julgado esse direito de punir solidificou-se.

Com a solidificação do direito de punir, nasce, então, o “jus executionis”, qual seja a pretensão executória da pena, o interesse do Estado de ver cumprida a sanção imposta na sentença condenatória.

Observe que temos no Direito Penal duas pretensões que devem ser exercidas dentro de determinado prazo. Não exercido o poder-dever do Estado, tempestivamente, este perde tanto o direito de punir quanto o direito de executar a pena.

Observe, ainda, que a pretensão para punir vem primeiro da pretensão de executar a pena. Em outras palavras, prescrevendo o direito para punir, por conseguinte desaparece o direito do Estado para executar a sanção. A perda do direito para punir fulmina de morte a execução da pena.
No caso específico, transcorrido o lapso de tempo de 7 (sete) sem que o Estado tivesse exercido seu poder-dever para punir, não que se falar em pretensão executória da pena imposta. Isso porque o papel punitivo do Estado não é apenas aplicar a pena. Para tanto, tem prazo previsto em lei.

O que aconteceu no caso vertente? O transcurso do tempo retirou do Estado o poder-dever para punir. E, consequentemente, para executar a reprimenda.

Para calcular a prescrição punitiva basta invocar-se a aplicação do art. 109, V, do CP. A regra geral é que a base de cálculo se dá a partir do máximo da pena tipificada, concretamente.

Operando-se – como se operou – a prescrição punitiva pelo decurso do tempo, o Estado perde o poder de executar a sanção imposta.

Na conclusão, como já existe uma sentença condenatória irrecorrível, os prazos prescricionais se baseiam na pena em concreto, conforme determina expressamente o artigo 110 caput.” A prescrição depois de transitar em julgado a sentença regula-se pela pena aplicada…).

Assim, Fernanda Marques foi condenada a exatos 2 (dois) anos de detenção. O Estado-poder tinha o direito para punir e executar até o limite temporal de 4 (quatro) anos, entre o recebimento da denúncia e o trânsito em julgado da sentença. Porém, já se transcorreram mais 7 (sete), impondo-se, pois, a extinção da punibilidade., por ocorrência da  pretensão executória, nos termos do art. 110 c/c 109 V, do CP, conforme, ainda, a dicção da Súmula 497, do Supremo Tribunal Federal (STF), expressando que ” a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença…”

O grande penalista italiano MANZINI ensina que a prescrição é uma renúncia ao Direito de Punir, admitida legal e preventivamente, pelo Estado, em face da força deletéria do tempo.

OBSERVE-SE A REGRA GERAL: a prescrição da pretensão executória referente à pena de dois anos de detenção, imposta na sentença condenatória, qualquer que seja o crime, vai prescrever em quatro anos se o condenado não é reincidente;…

É O CASO VERSADO!A pena imposta a Fernanda Marques está prescrita em ambas as hipóteses
“A prescrição penal é matéria de ordem pública, que pode ser reconhecida de ofício ou a requerimento das partes, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, nos termos do art. 61 do Código de Processo Penal” (STJ, HC 189.413/MG, 5ª Turma, rel. Gilson Dipp, DJe 10.05.2012).

“Ad argumentandum”, tratando-se de sentença condenatória transitada em julgado, o requerimento será dirigido ao juízo das Execuções. Em caso de indeferimento deste quanto ao reconhecimento da prescrição e a consequente extinção da punibilidade, cabe Habeas Corpus para a Instância Superior.

“Data vênia” é o parecer, smj!

TERESINA, 15 de junho de 2023

Fonte: Miguel Dias Pinheiro, advogado

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo