Supermercado de Batalha é suspeito de lavar R$ 7,4 milhões de empresa pública do DF, diz Gaeco
A informação foi divulgada pela colunista Mirelle Pinheiro, do Metrópoles, em reportagem nesta quarta
Uma investigação do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, revelou uma rede criminosa sofisticada, que teria transformado a Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) em um balcão de negócios, envolvendo o núcleo familiar do ex-diretor financeiro da estatal, Francisco José da Costa, para lavar R$ 7,4 milhões utilizando o Supermercado O de Casa, localizado no município de Batalha, região Norte do Piauí.
A informação foi divulgada pela colunista Mirelle Pinheiro, do Metrópoles.
Segundo levantamento feito pela colunista, o Gaeco apontou que as irmãs de Francisco José da Costa, Emiliane Ferreira da Costa e Maria Emília Neta do Nascimento, e sua esposa, Maria Bernardete, dona do supermercado que seria utilizado como fachada, integrariam o núcleo financeiro de um esquema que também envolveria empresas de fachada, políticos influentes e servidores cooptados.
Ainda conforme o Gaeco, Emilene Ferreira da Costa e Maria Emília Neta do Nascimento, movimentaram ao menos R$ 935 mil em propina, recebendo, pulverizando os valores ilícitos e os repassando em forma de pagamentos para outros servidores envolvidos no esquema.
Extração de dados dos aparelhos celulares apreendidos
As mensagens de WhatsApp analisadas pelo Gaeco revelam o controle que Francisco exercia. “Faz um pix de 10 mil”, ordena ele a uma das irmãs, indicando a conta de uma servidora da Novacap. Em outro diálogo, repreende a parente por mencionar o nome de quem havia feito o depósito: “Não precisa falar nome!!”.
A esposa, Maria Bernadete Machado, também atuava ativamente, cedendo sua conta bancária para transferências. O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou depósitos em espécie que ultrapassaram R$ 7,4 milhões em pouco mais de um ano, valor considerado incompatível com a economia da pequena cidade de Batalha, que possui pouco mais de 26 mil habitantes, no interior do Piauí.
Recursos eram usados para comprar lealdade
Segundo a investigação do GAECO, parte dos recursos originados da lavagem de dinheiro eram utilizados para comprar a lealdade de outros servidores da Novacap, como Sosthenes Oliveira da Paz e Renato Sousa Santanna, que recebiam depósitos indiretos para manter o esquema funcionando sem vazamentos.
Carro como “caixa eletrônico” e depósitos em espécie
Além do braço familiar, o grupo se apoiava em métodos tradicionais de lavagem, como o uso de dinheiro vivo. Mensagens cifradas, com códigos como “vamos tomar um café” ou “entregar documentos”, serviam para marcar os encontros.
Em uma ocasião, Francisco José enviou uma foto do porta-malas de seu Toyota Corolla aberto, sinalizando o local onde a propina deveria ser depositada. A confirmação veio durante a deflagração da operação Alta Conexão, quando os investigadores apreenderam R$ 329.340 em espécie em sua residência.
Empresas criadas para emitir notas e receber repasses
Para o bom funcionamento da organização criminosa, o grupo abria empresas fictícias para emitir notas e receber repasses, a exemplo da DM & Castro Engenharia, que pertencia ao servidor Aurélio Rodrigues de Castro e tinha como sede a própria residência dele.
Sem qualquer funcionário registrado, a empresa abriu conta bancária apenas sete dias antes de receber R$ 69 mil de uma das empreiteiras do cartel. Aurélio só foi registrado como representante bancário dois dias antes da transferência, o que, para o Gaeco, comprova o uso deliberado da empresa como fachada.
Atuação da “25ª deputada”
Identificada como Ivoneide Souza Machado Andrade Oliveira, então secretária da Comissão de Economia, Orçamentos e Finanças (CEOF) da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), o Gaeco apontou que ela atuava como facilitadora, destravando emendas parlamentares que abasteciam os contratos fraudulentos.
Logo no início da parceria, Ivoneide garantiu a Francisco José: “Pode contar comigo… transito em todas as áreas e gabinetes”. A aliança foi selada com “presentes” e favores. Em dezembro de 2020, pouco depois de receber um desses agrados, ela enviou uma lista de emendas disponíveis que somavam mais de R$ 11 milhões e perguntou sobre o desbloqueio de R$ 1,5 milhão.
A relação de troca era explícita. Em outubro de 2021, Ivoneide pediu um “socorro” de R$ 15 mil, lembrando uma ajuda anterior que recebera para uma viagem a Miami. No dia seguinte, enviou a Francisco documentos sobre a liberação de R$ 1,2 milhão para a Novacap, demonstrando que seu papel era essencial para manter o cartel operando dentro da legalidade aparente.
Corrupção sistêmica
As investigações continuam para rastrear o destino final dos valores e identificar outros beneficiados. O Gaeco já classificou o esquema como corrupção sistêmica, comparando a atuação de Francisco José à de chefes mafiosos pela capacidade de articular pessoas, empresas e instituições em benefício próprio.
A colunista Mirelle Pinheiro procurou os citados, mas não houve retorno até a publicação desta da reportagem.
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