Polícia

Como funcionava esquema que movimentou R$ 316 milhões na Novacap

Os alvos investigados pelo MPDFT são suspeitos de cometer crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e formação de cartel

Alvo da Operação Coringa deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), na manhã desta quinta-feira (12/6), um grupo formado por empresários e servidores da Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) é suspeito de atuar de forma sistemática entre 2021 e 2022 para beneficiar empresas parceiras em contratos públicos com o órgão, em troca de propina equivalente a 2% do valor dos contratos pagos.

Com apoio do Departamento de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Decor) e do Ministério Público do Piauí, por meio do Gaeco, os investigadores cumpriram 26 mandados de busca e apreensão no Distrito Federal e no Piauí.

Os alvos são suspeitos de cometer crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e formação de cartel. Durante as buscas, os promotores encontraram cerca de R$ 1 milhão em espécie dentro de uma caixa de papelão no supermercado “O De Casa”.

Para o Gaeco, o líder do esquema é Francisco José da Costa, conhecido como “Chiquinho”, ex-diretor financeiro da estatal.

Pagamentos acelerados, propina organizada

De acordo com as investigações, à frente da engrenagem criminosa, Chiquinho coordenava o favorecimento de empresas em processos internos da Novacap. Em troca de propina, ele teria articulado junto a outros servidores a aceleração no repasse de recursos públicos às construtoras contratadas.

A teia criminosa supostamente utilizava contas bancárias de familiares para movimentar e lavar o dinheiro, sobretudo as de suas irmãs Emilene Ferreira da Costa e Maria Emília Neta do Nascimento, que, juntas, receberam pelo menos R$ 935 mil em depósitos de origem ilícita.

Ainda de acordo com os levantamentos, também participaram ativamente do esquema Renato Sousa Santanna, Eliane Bonifácio de Moraes Soares, Sosthenes Oliveira da Paz e Aurélio Rodrigues de Castro, todos servidores da companhia.

Renato, por exemplo, teria sido beneficiado com R$ 50 mil em depósitos, enquanto Eliane, que chefiava a Divisão da Tesouraria, recebeu ao menos R$ 161 mil, atuando como uma espécie de “caixa automático” de Chiquinho. Já Sosthenes teve R$ 19,5 mil transferidos por operadores do esquema, e Aurélio recebeu R$ 69 mil disfarçados por nota fiscal falsa emitida por sua empresa, a DM & Castro Engenharia EIRELI.

Empresas de fachada, concorrência simulada

O MP também identificou fortes indícios de cartel, com empresas que, apesar de se apresentarem como concorrentes em licitações, atuavam de forma combinada nos bastidores para garantir o rodízio dos contratos e o pagamento de vantagens ilícitas.

Estão entre as empresas beneficiadas:
• Central Engenharia e Construtora Ltda
• Construteq Construções e Serviços Ltda
• GW Construções e Incorporações Ltda
• EB Infra Construções Ltda
• WF Construções e Incorporações Ltda
• Construtora Artec
• Belavia Comércio e Construções Ltda
• NG Engenharia
• Sigma Incorporações e Construções EIRELI
• LAN Empreendimentos e Construções EIRELI

Entre 2021 e 2022, essas empresas receberam R$ 316 milhões em recursos públicos, sendo R$ 112 milhões liberados diretamente com a interferência de Chiquinho. Estima-se que o esquema tenha rendido ao ex-diretor financeiro ao menos R$ 2,2 milhões em propina.

Operadores do sistema

Além dos servidores, diversos operadores teriam atuado como intermediários para garantir a fluidez dos pagamentos e a entrega da propina aos comparsas na estatal. Entre eles, estão Jonas Felix dos Santos, Luciano Neves Garcia, Marcos Boechat Lopes de Souza e Lucio André de Novaes.

Luciano, sócio da NG Engenharia, e Marcos operavam o esquema de liberação de ordens bancárias e repasses a Francisco José, com pagamentos posteriormente disfarçados em transferências bancárias a familiares. A NG recebeu R$ 124,7 milhões, sendo R$ 35,3 milhões com intermediação direta de Chiquinho. A Sigma, operada pelo mesmo grupo, recebeu R$ 14,5 milhões, com metade sob influência do ex-diretor.

Supermercado como canal de lavagem

As irmãs e a esposa de Chiquinho, Maria Bernadete, também participaram da lavagem de dinheiro. Os valores eram movimentados em espécie, transferidos a terceiros ou escoados para o supermercado “O De Casa”, controlado pela esposa do investigado.

Apesar de já ser réu em ação penal da Operação Alta Conexão, deflagrada em 2022, Francisco José continuava exercendo influência sobre os pagamentos da Novacap até os dias atuais. O MP apontou que, mesmo após a denúncia formal em julho de 2024, nenhuma medida foi adotada para afastá-lo do cargo.

Com a operação desta quinta (12), a Justiça determinou o afastamento de Francisco José da função pública; bloqueio de bens móveis e imóveis dos investigados; bloqueio de cerca de R$ 1 milhão em contas bancárias; bloqueio de uma aeronave e uma embarcação.

As apurações seguem para o aprofundamento das relações entre os investigados, os operadores financeiros e as empresas supostamente concorrentes, com foco em desarticular o cartel e responsabilizar os envolvidos.

O outro lado
Procurada pelo Metrópoles, a Novacap informou, por meio de nota, que a sede do órgão “sofreu busca e apreensão conduzida pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), onde foram apreendidos documentos, cinco computadores e um pen-drive no departamento financeiro da empresa.”

A companhia também informou que as investigações transcorrem de maneira sigilosa na Justiça, e, por esse motivo, não tem acesso ao conteúdo da Investigação. “Porém, reforça que colabora integralmente fornecendo todas as informações solicitadas pelas autoridades competentes, e reitera seu compromisso com a transparência e a legalidade nos processos de contratação pública.”

·         Gaeco investiga esquema que movimentou R$ 316 milhões na Novacap

 

Por Meirelles Pinheiro/Metrópoles

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