Coisas que arrepiam
A entrada do governador Wilson Martins no Caso Fernanda Lages me traz à lembrança de um outro episódio trágico com desfecho desastroso e patético. Na madrugada de 28 de julho de 1987, foi brutalmente assassinado em casa, na zona Leste de Teresina, após uma sessão de espancamento, o jornalista e empresário Hélder Feitosa, dono do jornal O Estado e das Rádios: Poti AM e FM.
O crime obteve ampla repercussão. Por dias seguidos, em toda esquina, a pergunta era uma só: quem matou Helder Feitosa? Havia especulações para todos os gostos, como no Caso Fernanda Lages. O governador Alberto Silva, acuado, decidiu entrar pessoalmente no caso e chamou de Brasília o perito criminal Aidano Faria.
A ficha do perito recomendava: ele vinha do desvendamento do misterioso assassinato do radialista Mário Eugênio, da Rádio Planalto, no final de 1984. Chegando em Teresina, com contrato a peso de ouro, ele assumiu a coordenação das investigações. Em pouco tempo, três jovens – Parcifal, Nikita e Paulo Cabral – eram apresentados como autores da morte de Hélder Feitosa.
Não houve qualquer contestação quanto ao resultado da investigação. A Polícia e o Ministério Público endossavam as conclusões a que chegou o perito brasiliense. A imprensa local engoliu o inquérito incriminando os três acusados. O crime estava, enfim, elucidado, e o governo com a sensação do dever cumprido!
Entretanto, na Rádio Difusora de Teresina, o único veículo de comunicação da capital à época com linha editorial independente, o jornalista Arimatéia Azevedo desconfiou do resultado da apuração policial e bancou, num ato de loucura profissional, uma investigação paralela. Só com a cara e a coragem, desafiava a tudo e a todos. Para tanto, contou com a parceria destemida do advogado Cadena Neto, também defensor público.
De saída, o jornalista e o advogado descobriram que a polícia arrancou confissões dos acusados mediante seguidas e intermináveis sessões de torturas. À época, além de apresentar com Arimatéia Azevedo o principal programa jornalístico da Difusora, “Cidade Livre”, eu era correspondente do “Correio Braziliense” no Piauí e mandava para lá, diariamente, matérias sobre a apuração paralela do jornalista. Foram dias tensos, mas a farsa caiu, o perito retornou às pressas para Brasília, os inocentes foram soltos e até hoje nem a polícia nem o Ministério Público nem a imprensa pediram-lhes desculpas.
Preocupa-me, desde então, o fato de um governador entrar pessoalmente num caso policial rumoroso, por melhor que seja a sua intenção.
*Zózimo Tavares é editor chefe do jornal Diário do Povo]]>